Ballet é chato…

Um amigo e colega de trabalho postou recentemente uma citação em sua página no Facebook e isso me fez pensar. O grande coreógrafo George Balanchine disse uma vez: “Se você não se sentir desafiado, é porque você não está fazendo o suficiente. No ballet, você nunca deve se sentir confortável. Confortável é ser preguiçoso! Se você está confortável quando você dança, você não está se esforçando o suficiente. 100% não é suficiente. Você tem que dar 200%. Um tendu leva anos de trabalho duro e nunca será perfeito. Tudo no ballet é um desafio. ”

Eu não posso te dizer quantas vezes eu ouvi de meus alunos, ‘Ballet é chato. Agora, eu darei um discurso do tipo “no meu tempo”… discurso este que já está ultrapassado. Eu não lembro de me sentir desse jeito e eu também não me lembro de nenhum dos meus colegas, com os quais eu cresci dançando, se sentir assim e muito menos dizê-lo a um professor. Na verdade, eu não gostaria de imaginar o que aconteceria se nós tivéssemos dito. O mundo está mudando definitivamente. Os alunos de hoje pensam que um desafio é fazer várias piruetas, mesmo mal realizadas, ou girar uma sequência de fouettés e fazer os grandes saltos. Eles querem realizar os passos, mas eles não têm o cuidado sobre o quão bem eles irão executá-los.

Eu realmente não gosto e me sinto frustrada quando ouço os alunos dizerem que uma aula não o está desafiando o suficiente. Margot Fonteyn fazia as aulas para iniciantes várias vezes por semana, a fim de aperfeiçoar a sua técnica. Ela se desafiava em níveis mais baixos, embora ela estava no topo de sua profissão. Eu sinto muito em dizer que nenhum dos meus alunos que me disseram isto é ou será uma Margot Fonteyn com essa atitude

Esta tipo de pensamento não é somente dos estudantes. Esta forma de pensar vem dos pais. Ouço comentários dos pais como: “Trabalhe ela com intensidade lá dentro!” Ummm … Eu não posso fazer com que uma criança se esforce, isto é com ela. Apenas algumas semanas atrás, uma mãe veio me questionar o porque de uma criança ter de repetir um nível de ballet. Expliquei à mãe que a criança não estava focada e não trabalhou com toda a dedicação ao longo do ano. O pai então disse: ‘Bem, talvez ela não está fazendo essas coisas porque ela está entediada e não foi estimulada apropriadamente. Colocando-a no nível seguinte poderia ser um incentivo. “Não é assim que funciona! Eu não irei recompensar um comportamento preguiçoso. Ela precisa trabalhar no nível que ela está e provar para mim que ela quer estar em uma turma mais avançada, onde o foco e a ética de trabalho serão mais exigidos”. Não me lembro dos meus pais questionarem os julgamentos dos meus professores, e se eles tivessem ouvido o que eu disse a este pai sobre mim, eu teria recebido uma lição sobre ética de trabalho.

Falando de ética de trabalho, isso também é algo que infelizmente está faltando nesta nova geração. O problema é que eles não estão tentando ser preguiçosos; eles realmente acham que estão trabalhando muito, quando na verdade, eles nem sequer estão chegando perto. Por exemplo, eu pedi a uma aluna para que ela levantasse mais a sua perna em um developpé. Sua perna subiu muito! Se ela estivesse realmente trabalhando com o máximo do seu potencial, não teria subido tanto assim, teria subido só um pouco mais… e isso é ser preguiçoso! Isso acontece uma e outra vez nas minhas aulas. Eu tenho que perguntar a um aluno por que eles estão fazendo uma única pirueta quando eu sei que eles podem fazer duas. Eu tenho que gritar com eles para saltar mais alto e, de repente, eles estão voando pelo ar. Por que eu tenho que pedir, implorar para eles fazerem o seu melhor? Quando eu era criança, a perna de ninguém da sala seria mais alta do que a minha, ninguém iria se equilibrar mais tempo do que eu e os pés de ninguém ia ser mais trabalhado do que o meu. Eu não estava sendo má com os outros alunos, mas eu não iria permitir que ninguém na sala fosse melhor do que eu. Então, eu gostava de ficar atrás da melhor aluna da sala e trabalhava para copiar tudo dela. Onde estão os alunos que estão dispostos a lutar para melhorar? Eles estão se tornando escassos e raros a cada ano que passa. Talvez Balanchine estava certo e essas crianças precisam trabalhar 200% a fim de alcançar a sua plena capacidade.

Eu adoro quando meus próprios alunos percebem que não tem trabalhado todo o seu potencial. Eu tinha uma aluna avançada no ano passado que me confidenciou que ela desejava ter aprendido a trabalhar mais cedo. Ela me disse que ela sabia que foi uma das alunas mais esforçadas nos últimos dois anos, mas, em seguida, lamentou-se porque ela desejava ter descoberto o potencial que ela tinha mais cedo. Ela imaginou o quanto mais longe ela poderia ter ido com sua formação em dança, se ela tivesse trabalhado mais. Lembrei-lhe que o importante foi que ela entendeu isso agora e que ela continuaria nesse caminho durante a sua formação posterior. Eu também tive uma mãe que veio me dizer que sua filha estava voltando para casa mais suada e cansada do que o habitual e eu ri e disse-lhe que sua filha tinha finalmente descoberto como trabalhar. No dia seguinte, a mãe entrou e disse-me que no início ela tinha se sentido ofendida com meu comentário e compartilhou isso com sua filha. Sua filha riu e disse: “Sim, eu acho que finalmente fez um “click” de como trabalhar e que eu poderia estar fazendo um trabalho muito melhor do que eu tinha feito, ser muito melhor do que eu tinha sido. Espere até você me ver durante a observação dos pais na próxima semana; Estou ficando muito boa nisso! ”

Enquanto estamos falando de diferenças de gerações, posso dizer-lhes que os alunos também se queixam, reclamam muito mais do que no passado. Talvez nós não nos queixávamos com os nossos professores porque sabíamos que eles não iriam se importar se o nosso dedo do pé estava ferido, ou se estávamos cansados ou se tivemos um dia ruim na escola. Não parece haver uma compreensão entra a diferença entre um desconforto, uma fadiga e uma dor real nas crianças de hoje. Uma das minhas histórias favoritas para contar sobre isto é esta: um dos meus colegas estava consertando um arabesque de uma menina de 10 anos. Depois que ele a arrumou, a criança se queixou de dor nas suas costas. Ele, então, perguntou para a sua turma se eles já haviam conversado sobre o que é dor. Todos eles balançaram a cabeça dizendo que não. Ele, então, perguntou se elas gostavam de patinação artística. Todos assentiram um sim entusiasmado. Ele então disse: ‘Bem, você sabe quando uma patinadora tropeça, cai e bate a cabeça no gelo? Isso é dor! Todas arregalaram os olhos. Penso que esta é uma excelente maneira de explicar aos jovens alunos a diferença entre estar numa posição desconfortável e uma estar com uma dor perigosa e afiada. Embora eu tenha que admitir, quando eu tinha essa idade, eu não me lembro de ninguém ter me explicado a diferença entre os dois. Ele então perguntou a menina que relatou a dor como ela se sentia depois de sua explicação e ela respondeu: “Está tudo bem.” É isso mesmo! Você está dolorida, você está desconfortável, você não está com dor.

Escuto das minhas alunas do Musical Theatre College (estudantes universitários), muitos dos quais são iniciantes, frases como: ‘Por que eu não consigo fazer isso? “, ou” Por que a minha perna não é como a sua?”. Na grande maioria, meus estudantes universitários são maravilhosos, altamente motivados, trabalhadores e focados em querer fazer bem. Eu tento explicar-lhes que dançar ballet é um processo que leva muitos anos e que bailarinos profissionais ainda continuam aperfeiçoando a sua técnica. Além disso, digo-lhes que tenho dançado ballet por toda a minha vida, e é claro minha técnica vai ser melhor, seria triste se não fosse! Mas o que mais eu vejo neles é uma recompensa instantânea após uma bom trabalho, exatamente o que está faltando nesta geração. Eles pensam que se eles trabalharem duro, eles conseguirão o que desejam alcançar. Para eles, ballet não é chato, é frustrante. Eles nem sempre encontram a alegria no trabalho duro e querem apenas os resultados que eles não conquistaram ainda. Talvez eles precisam ser lembrados de que, “um tendu leva anos de trabalho duro e nunca será perfeito. Tudo no ballet é um desafio. ”

Como professor, eu quero que meus alunos alcance o sucesso e que ele seja acima de suas expectativas, e das minhas também. Eu não posso fazê-los trabalharem duro, isso é algo que eles tem que fazer por si mesmos. Eu só posso dar-lhes todo o meu conhecimento, a informação necessária e o meu tempo, além de tentar inspirá-los a fazer o seu melhor. O que eles farão com tudo isso depois, é com eles. Uma das lições que eu mais me esforço para ensiná-los é de que o ballet não é chato, especialmente se você está fazendo tudo corretamente. Enquanto isso, aproveite o trabalho e divirta-se.

Fonte:

Ballet is Boring


Autora: Miss Erin
Data: 09 de Outubro de 2014

Tradução Livre: Thaís Barata

Ballet Is Boring

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